Inteligência Artificial: Os 10 insights sobre onde nós estamos e para onde vamos
Digital / Estratégia / Marketing / Midia Social / Presença DigitalPublicado em 30/09/2020 às 13h57
Ainda não vivemos a era das máquinas superinteligentes que habitam o imaginário popular, mas estamos caminhando cada vez mais rapidamente para chegarmos lá. E a grande questão que não quer calar e permeia essa jornada é: para onde vamos?
O que não falta na mídia são tanto as visões utópicas (como o Homem Bicentenário ou The Jetsons) quanto as distópicas (como o Exterminador do Futuro ou Black Mirror) sobre o nosso futuro com as máquinas. As discussões tornam-se cada vez mais acaloradas e passam a ocupar todo tipo de ambiente: universidades, mídia, mercado, negócios, invadindo também as conversas de bares e rodinhas de amigos.
Não é à toa que vemos esse aumento repentino e gigantesco de interesse ao redor de tudo aquilo que se refere a Inteligência Artificial (ou AI, devido às iniciais de Artificial Intelligence, em inglês) – apesar de habitar o imaginário da humanidade desde a antiguidade e de ser reconhecida oficialmente como disciplina desde a década de 50, somente nos últimos anos, as tecnologias computacionais alcançaram um estágio de evolução suficientemente avançado para dar vazão a esse tipo de processamento.
As aplicações práticas de AI têm se disseminado rapidamente e virtualmente em todas as áreas do conhecimento: medicina, agronegócio, finanças, educação, marketing, segurança, etc. De algoritmos de linguagem natural (que viabilizam os chatbots) a sistemas de visão computacional e análise preditiva, as APIs inteligentes passam a ser disponíveis, escaláveis e acessíveis para qualquer tipo de negócio, ampliando ainda mais as suas possibilidades de uso.
Dominar o desenvolvimento e uso de AI, tem ser tornado cada vez mais fundamental e estrategicamente importante, pois significa melhoria de produtividade e vantagem competitiva. Por isso, estamos vivendo uma espécie de “corrida do ouro” em torno da AI – países e empresas estão investindo cada vez mais para liderar a área e se tornar mais inteligentes. O IDC (set/2017) prevê que o gasto mundial em sistemas cognitivos e AI suba de U$ 7.5 bi em 2016 para U$ 57.6 bi em 2021. Hoje, os Estados Unidos é líder mundial em AI, mas a China criou um plano com investimento de meio bilhão de dólares com meta de assumir a liderança até 2030, em três etapas estratégicas: 1) 2020: estar no nível dos melhores do mundo; 2) 2025: AI como driver principal para a indústria chinesa; 3) 2030: liderar o topo das tecnologias de AI.
E a largada foi dada para países, empresas e pessoas!
O relatório AI Index da Stanford University (focado em rastrear as atividades e progressos nas iniciativas de AI) mapeia em dados esse movimento crescente de tudo o que se refere a AI:
14x mais startups ativas de AI desde 2000;
- 6x mais investimentos de VC em startups de AI desde 2000;
- 5x mais vagas de trabalho requerendo skills de AI;
- as 3 habilidades mais demandadas no Monster.com (polular site de empregos nos USA) são Machine Learning, Deep Learning e NLP (Natural Language Processing);
Isso torna-se bastante evidente também nas palestras e discussões apresentadas nos eventos de ponta sobre AI, como é o caso do EmTech Digital da MIT Tech Review, um dos mais importantes do mundo quando o assunto são tecnologias emergentes. Tive o prazer de participar novamente desse evento nesse ano, reforçando, complementando e ampliando as minhas reflexões sobre AI, e compartilho, a seguir, alguns desses insights:
Era da incerteza e imprevisibilidade — estive nesse mesmo evento há 3 anos, e é interessante observar que, apesar de AI dominar a cena hoje, em 2015 não era assunto e não fazia parte das tecnologias emergentes discutidas então. Isso mostra a complexidade dos nossos tempos, a incerteza e imprevisibilidade: no cenário acelerado em que nos encontramos, é impossível prever o futuro, até mesmo para a MIT Tech Review.
- AI é “A” tecnologia emergente – enquanto no passado esse evento tratava de inúmeras tecnologias que emergiam como tendências, como vídeo, RA e RV, desde 2017 ele tem focado quase que totalmente em AI. As demais tecnologias apresentadas gravitam em torno de AI: robótica, IoT, etc.
- Ciências da Computação vs Ciências Humanas – uma ideia comum, mas equivocada, é que AI é tecnologia e, portanto, refere-se apenas às ciências da computação. Na realidade, o desenvolvimento estratégico da área envolve pensamento crítico, linguagem, negociação, ética e inúmeras outras áreas de humanidades – ou seja, ciências humanas. Assim, o diálogo entre os mais diversos campos do saber é essencial para o nosso futuro. Uma frase que resume de forma brilhante essa questão é:
“Descobrir COMO otimizar é um problema das Ciências da Computação.
Descobrir O QUE otimizar não é.”
– Nate Silver
AI hoje: muita inteligência, pouca autonomia – frequentemente vemos acontecer a confusão entre os termos ‘inteligente’ e ‘autônomo’. No entanto, saber a diferença entre eles é essencial para entender onde estamos, pois a AI hoje tem alta inteligência, mas baixa autonomia. O CEO do Allen Institute for AI, Oren Etzioni, traz um exemplo extremamente didático que mostra isso: um adolescente que se embebeda insanamente com amigos possui alta AUTONOMIA, mas baixa inteligência; um sistema como o AlphaGo (que vence o melhor jogador humano de GO tem alta INTELIGÊNCIA, mas baixa autonomia (pois não consegue fazer nada mais além de jogar GO).
- Mundo sem leis – vivemos hoje, com a AI, o mesmo cenário que a sociedade enfrentou com o surgimento dos carros no início do século passado: as pessoas simplesmente podiam dirigir sem possuir habilitação, não existiam semáforos, sinais de trânsito, cintos de segurança, leis, etc. Muitos acidentes e mortes aconteceram antes que surgisse e se consolidasse uma regulamentação. As discussões atuais em torno de inteligência artificial buscam encontrar os melhores caminhos para regular o seu uso. No entanto, como AI é uma tecnologia genérica, que pode ser aplicada em qualquer área, a regulamentação precisa ser criada por campo específico de aplicação: carros, brinquedos, robôs, etc. para ser eficiente.
- Dados são o combustível para AI – o cérebro humano aprende com dados: sejam dados existentes (provenientes das experiências de outras pessoas) ou dados que geramos com nossas experiências (provenientes de tentativa e erro). Assim, o primeiro passo para ter inteligência, é ter dados. AI sem dados é como um cérebro vazio, sem memória – não tem o que processar. Ambientes ricos em dados são altamente propícios para a aplicação de AI.
- Inteligência Humana vs Inteligência Artificial – Brenden Lake, professor assistente da NYU, apresentou alguns dados interessantes comparando o estado atual da AI e a inteligência humana, auxiliando a compreensão da evolução da tecnologia:
- Pessoas aprendem com menos dados que os melhores sistemas de AI;
- Humanos constroem modelos mais ricos e flexíveis do mundo, enquanto a AI atual é movida por reconhecimento de padrões;
- Ingredientes cognitivos essenciais ainda estão ausentes ou são subutilizados na AI atual.
- PERIGO: a automação da desigualdade e do preconceito – mesmo que não percebamos, AI está começando a tomar decisões em todos os lugares. Sistemas como Hirevue Video Intelligence, que analisa o vídeo de um candidato a emprego para recomendar a contratação ou não, começam a ser usados cada vez mais sem que saibamos quais critérios são usados para isso. Timnit Gebru, da Microsoft Research, apresentou estudos que mostram que quanto mais escura a cor da pele, mais os algoritmos erram em detectar faces. Assim, existem riscos de enviesamento e preconceito na decisão desses sistemas. Em algumas situações críticas, mesmo que os sistemas tenham taxas de 95% de acerto, os casos que caem nos 5% de erro podem estar sofrendo injustiças gravíssimas, inadmissíveis. Uma coisa é errar na previsão do tempo, outra coisa, muito diferente, é errar em uma decisão de pena de morte, por exemplo. Como os algoritmos de AI aprendem com dados existentes ou com pessoas, eles tomam decisões baseando-se em comportamentos aprendidos do passado ou de culturas – quanto mais preconceitos e desigualdades estiverem contidos nesses dados (mesmo que sejam preconceitos inconscientes), mais eles se tornam automatizados e amplificados. Nesse contexto, precisamos criar especificações de APIs, planilhas de dados e modelos para garantir a diversidade e igualdade de representatividade nos dados usados para AI. A temática “moral e ética de AI” é, na minha opinião, a mais importante para pavimentar o caminho no desenvolvimento tecnológico para garantir uma convivência de sucesso entre humanos e máquinas.
- Robôs: a habilidade de “pegar” as coisas é a fronteira decisiva – temos visto robôs que falam, correm, saltam, cambalhotam…. e por mais que isso seja impressionante, eles ainda não dominam uma das habilidades essenciais para revolucionar o mundo: pegar as coisas. Parece simples, não? Nós, humanos, fazemos isso com muita facilidade – olhamos para algo e já calculamos suas características de matéria (massa, textura, etc) e estruturais para pegarmos o objeto da melhor forma possível. Para os robôs, isso ainda não é tão fácil, e aprender a pegar algo é o estado da arte na área. O grande desafio para os robôs pegarem coisas (grasp) envolve [física + percepção + controle], e assim que eles dominarem essa habilidade, poderemos contar com robôs para separação de lixo (e de qualquer tipo de coisa), reabastecimento de prateleiras nos supermercados, auxílio nos afazeres domésticos, etc – revolucionando a indústria, varejo e lares.
- Robôs: os imigrantes do futuro – uma das questões mais debatidas em qualquer evento atual de tecnologia é o futuro do trabalho, assunto que discuto bastante no meu livro “Você, Eu e os Robôs” – a minha linha de pensamento está em sintonia total com o que foi apresentado no #EmTechDigital desse ano. A “Automation Anxiety” existe na ficção desde a antiguidade e, conforme os robôs tornam-se realidade, ela aumenta. No entanto, uma analogia bastante apropriada criada por Oliver Morton (The Economist) ilumina o assunto por outro ângulo – desde os tempos mais remotos as pessoas têm medo de perder os seus empregos para os imigrantes. Em toda a história da humanidade, os imigrantes são comumente vistos com desconfiança devido à essa ansiedade. Morton compara os robôs com os imigrantes, só que vindos do futuro. E da mesma forma que as sociedades aprendem a absorver as características dos imigrantes, complementando as suas, tenderemos a fazer o mesmo com os robôs que passam a coexistir cada vez mais conosco.
Artigo escrito por Martha Gabriel > Blog > Inteligência Artificial: 10 insights sobre onde estamos e para onde vamos.